Hashtag Economia Comportamental #138
Por que a Economia Comportamental está perdendo interesse no Brasil?
#Editorial
Na semana que passou tivemos um evento muito badalado no Brasil com a vinda do Dilip Soman para uma palestra sobre Economia Comportamental na ESPM. É incrível que pesquisadores e pensadores reconhecidos como Dilip venham ao Brasil compartilhar sua experiência.
Não podemos deixar de reconhecer também todo o esforço da ESPM, da Comunidade de Ciências Comportamentais, do GEEC e de alguns outros grupos para manter a Economia Comportamental em evidência e viva no cenário brasileiro. Entretando, mesmo reconhecendo os esforços, é triste perceber que a área tem sofrido com um esvaziamento de conteúdos, discussões e atores nacionais.
Já comentei aqui algumas vezes sobre a falta de integração entre as diferentes iniciativas que, a meu ver divide, mas não conquista de forma efetiva o mercado brasileiro.
São muitas ações de elevado padrão, espaçadas de forma irregular no tempo, com frequências falhas e que se perdem no mar de algoritmos de pesquisa, perdendo em relevância orgânica pela não regularidade na publicação de conteúdo.
Diferente do que vemos ao redor do mundo, no Brasil a regra são iniciativas particulares, grupos diversos que pouco se coordenam entre si e com isso perdem a oportunidade de estabelecer a Economia e Ciência Comportamental como uma área de relevância, atuante e reconhecida como solução.
O resultado dessa fragmentação é facilmente observável, pela pouca oferta e notícia de projetos na área no setor privado, pouca produção de conteúdos, o deserto da temática nas principais redes sociais e pela atuação ainda errática da CINCO agência de governo com foco na aplicação de insights comportamentais.
Como o que disse acima, é apenas uma percepção pessoal anedótica e que pode conter vieses. Sendo assim, para evitar ser injusto ou compartilhar uma visão equivocada da situação, fui olhar como os principais termos de pesquisa para a área e Economia Comportamental estão se desempenhando no Google.
Colocando os termos Economia Comportamental e dividindo entre campo de estudo (azul) e termo de pesquisa (vermelho) o gráfico mostra que desde 2022 onde houve um pico de interesse, para os anos seguintes o interesse praticamente desaparece.
Algo parecido acontece com o termo de pesquisa Nudge. Que apresentou um pico em 2012, perdendo muita relevância, apresentando em agosto de 2024 até o momento apenas 18% de interesse quando comparado ao pico de 2012; uma queda de 82 pontos percentuais.
A notícia não tão ruim assim fica por conta dos termos Ciência Comportamental (azul) e seu plural Ciências Comportamentais (vermelho), registrando picos de interesse em abril de 2009 e abril de 2014 respectivamente. Apesar de também demonstrar queda acentuada do interesse desde os picos observados de interesse, parece que os termos têm ensaiado uma retomada de interesse tímida, mas já é melhor que os demais termos avaliados.
Vou poupar vocês de outro gráfico, mostrando o comportamento do termo Finanças Comportamentais, que teve pico de interesse em abril de 2008 e desde então está perdeu 78 pontos percentuais no interesse.
Correndo o risco de ser repetitivo e cansativo, insisto em dizer que a falta de coordenação e alinhamento entre as diversas iniciativas, pode ser um fator limitante de um melhor desempenho da área no Brasil.
Quando olhamos iniciativas pelo mundo, uma característica comum daqueles que tiveram mais sucesso e notoriedade, está na capacidade de juntar forças daqueles interessados pelo campo de estudo e com isso impulsionar de forma coordenada os conteúdos, as pesquisas, congressos, eventos e todo o mais que já sabemos.
Não faltam exemplos do Behavioral Scientist, passando pelo Behavioral Economics Guide e tantos outros. Enquanto isso por aqui, ficamos reclusos em nossas bolhas cada um fazendo a força que consegue para a direção mais conveniente e que nos leva a uma resultante cada vez menor em termos de interesse e engajamento do público em geral.
Aproveitando o clima eleitoral, candidatos a promoção de uma integração em torno da área de Economia e Ciência Comportamental no Brasil, têm meu apoio e meu voto!
Afinal, passado o Hype… Já é hora de pensarmos em construir um Hub.
🗣️Frase da semana
“Não considere nenhuma prática como imutável. Mude e esteja pronto a mudar novamente. Não aceite verdade eterna. Experimente.”
____ Skinner, 1948
#Assista&Reflita
Sobre hábitos e motivação, já ouvimos muitas pesquisas, insights e métodos, mas de vez enquanto aparece algo mais. É exatamente esse algo mais que o TED com a Ayelet Fishbach entrega em apenas dezessete minutos.
Com um tom leve ela agrega mais um ponto de vista e insights que certamente ajudarão todos que de vez enquanto perdem a rotina de hábitos que não deveriam se perder.
Vale o play!
🧠Nudges de ontem, perigos de hoje
As eleições estão chegando e com elas toda nossa atenção para nudges e manipulações de arquitetura de escolha e exploração de vieses cognitivos. Pela história não faltam exemplos de manipulações, até mesmo grosseiras como aquela que foi implementada, infelizmente com sucesso, no plebiscito alemão.
A cédula de votação distribuída em 1938 para medir o apoio austríaco ao ‘Anschluss’ (a fusão da Áustria com a Alemanha) incluía um empurrãozinho (Nudge) grosseiro que envolvia tornar a caixa de seleção ‘Ja’ (sim) mais do que o dobro do tamanho da caixa ‘Nein’ (não). De 4,3 milhões de boletins de voto registrados, apenas 11.281 foram marcados como ‘Nein’.
É improvável que tenhamos algo parecido ao plebiscito alemão de antes da Segunda Guerra, no entanto… Um viés que pode afetar demais a escolha de candidatos é o desequilíbrio da exposição na mídia. Candidatos com maior exposição nas mídias tendem a ter um benefício indireto na percepção do eleitor e podem definir o jogo eleitoral.
💡É possível prever comportamentos?
Talvez esta seja a maior ambição de todo pesquisador do comportamento humano. Se perguntarmos, talvez todos neguem. Ainda assim me arrisco em afirmar ser este o objetivo maior. Mas quando olhamos para a complexidade do ambiente, para a quantidade de variáveis que possam atuar para determinar um comportamento, parece ser uma tarefa impossível.
Mas se olharmos para as Ciências Naturais, métodos matemáticos e incrementarmos metodologias utilizando melhor as ferramentas quantitativas, talvez haja uma forma.
E é esta forma que o pesquisador Gerd Gigerenzer discute em seu último artigo, ainda no campo da argumentação e filosofia. Com ambos os pés no chão e muito bem embasado em pesquisas de físicos de peso, Gerd Gigerenzer remonta às experiências de físicos que se abriram para psicologia e argumentaram que mesmo com todas as dificuldades, é possível modelar e prever comportamentos.
Um trecho do artigo do Gerd Gigerenzer para estigar a leitura de vocês:
O comportamento dos indivíduos (do crime ao suicídio e ao casamento) era errático e em grande parte imprevisível, mas visto como um coletivo, seus meios e variações eram estáveis e previsíveis. (Porter, 1986). Os físicos Ludwig Boltzmann e James Clerk Maxwell leram a física social de Quetelet enquanto ponderavam sobre o comportamento errático das moléculas de gás e raciocinaram que as moléculas podem se comportar como os humanos, imprevisíveis como indivíduos, mas previsíveis como um coletivo (Porter, 1986). O resultado foi a descoberta da mecânica estatística, baseada na mesma distribuição normal.
📚Leitura em destaque
Quer um exemplo de viés da confirmação pujante?
A história controversa das grandes consultorias internacionais e seus contratos com Governos e grandes empresas são, sem dúvida, um terreno fértil para procurar. Atuando como agentes a confirmar interpretações e visões particulares da realidade, grandes empresas de consultoria como PWC, Deloitte, McKinsey e outras enquadraram problemas com soluções particulares e de quebra criaram um ambiente artificialmente complexo.
O resultado presente até hoje foi uma profunda infantilização e dependência da gestão pública dos serviços destas consultorias, que não bastasse, ainda têm muitos resultados questionáveis.
Leitura interessante e que mostra muitos insights de vieses plantados no setor público, pelas consultorias.
PS: a recomendação já havia passado por aqui na versão em inglês, agora traduzida. Livro em inglês saiu com nome The Big Con.
🏃💨 De saídas
🔜Vem aí: Uma das publicações mais aguardadas e relevantes na área de Economia Comportamental está prestes a ter uma nova edição. O Behavioral Economics Guide, segundo anunciado no site, será publicado no próximo mês (set/24). Mal posso esperar! [.htm]
👩💻Kabit: Precisando de ajuda para manter seus hábitos dentro das suas metas? O Kabit, um app gratuito disponível ainda apenas para iOS (Apple), promote fazer monitoramento de seus hábitos, definir metas e dar aquela dose de recompensa, comemorando com você cada novo marco alcançado. É simples e gratuito! [.htm]
🏃➡️Queimou a largada: já anunciado para o próximo ano, sem nenhum detalhe que valha a pena divulgar, o quinto BEL Seminar. O evento já tradicional é realizado pelo Behavioral Science Lab da USP, que deve ter adotado o nome em inglês para parecer mais cool - não precisava. Vale monitorar a abertura para envio de artigos e evitar a correria ou a reza forte para extensões de prazos, que quase sempre acontecem. [.htm]
🛋️Gerações X, Y, Z: apesar de ser uma tarefa ingrata, tentar enquadrar todo um conjunto de pessoas em um único rótulo, ainda tem gente tentando. O esforço, no entanto, é válido, mais pela análise contextual que precisa ser ampla suficientemente para que o rótulo funcione. Dessa forma a leitura do relatório da BeHive pode interessar. [.htm]
💡Acurácia e precisão: sabe aquela imagem dos alvos utilizada para apresentar e resumir os conceitos de vieses e ruído? Ela aparece inclusive no livro do Kahneman (Ruído). Então, esse post do Asad Naveed, bem que complementa um pouco essa análise em termos do que seria acurácia e precisão e vai proporcionar uma reflexão interessante, mas só se você já leu ou conhece o conceito de ruído estabelecido pelo Kahneman. [.htm]
🎁Achados da semana
💥Framework para analisar criticamente artigos quantitativos
#Aterrissaram 🛬
🎉Boas-vindas aos novos inscritos: pr25ramalho, patricialima.financas02, vhpieri, pbbeserra, gabriel.arantes7, metodofinancasevida, giovanninibaarbosa, marianavantini, renata.garcia.fit, danilomoreno97, mbnazario, alexefg, hevertonrodrig, lfelipesfranco, vhsabino, guilherme.loverbeck, micheltosta, carteiraazulconsultoria, mayllon.rodrigues, lucianaviana18, danielferreiratrab, flwagner21, arrudapimentell, annaluizaagaldino, wilkiane_bsilva, rafaelrpereira92, mariozan.mota, asilva, jpnslucas, santosisaac41, callas_iglu0w, artbc10, amauri.cassiolato, andre.finguer, helderiguana, gammon-sealant.0o, eduardogmartins, maximiliancf.cnpi, leila.nemes, eduardomagalhaes948, lipeachnitz, dio9olobo, v.beraldi, leticiabaleiro, witinhoferreira, gabrielb.sgorla, emerson.gabreira, fernandamatoso.fp, rjbinho, barbaracrodrigs, jansem.nogueira, julio.ornellas, brunosb, natanlira, buenocosta.gilvan, bruno.shahini, eduard.j.17, bruni_santiago, diegodalmeida, perito.zuim, viniciuspb, rubenspeixoto_9, danymarra, financeiro.sergio, matheussilvaeu, genildo.leite, hieroliveira, ronaldoriccioppo, davizinhoc, camposfelipea, andre, festaregue, wagnerufes, marcofarani, phillipeluiz, urquizapb, fabricio_glucas, 40pramelhorar, Matheusjose714, ragalete, gustavo.souza007, Carlosmendes83, alberto.frazao, Marcel_laste, celoleite, anaelisavet, Santannasan63, wfeitosagis, mbmattia, acarolineoli, jairodc_8, eric.godoi65, higor.f.rosa, Osmir_torres, jacobini, arturbalster, quelccr, joao.daiuto, eduardoteste427, emsenaeng, gustavofosco, soraiabarbosa, leonardoigg21, juliano.evangelista.br, dossantos.thiagopereira, caio.piccaluga, paulo.pellucci, mazzon2006, Fred, icionek, Luisfellipe, tiago.velosomachado, bernardotomaz, danilo_sf, adrianomdantas, santanacamila82, fabiohmes, danielamodiano, jobsoneconomista, romaria.psilva, gustavo.nairne, andre.nepomuceno, flancleybruno, flaviohrsilva2000, researchdowntown, kauanagarajal, marcelo.s.antunes, ph.merotti, gabriel.mattos, bvitro8, igormribas, ramon.vasconcelos e henriquegabrielptc.
Concordo com a percepção de que o fenômeno é mais global do que local, e (parcialmente) com os motivos apontados - especificamente, trocaria "replicabilidade" por "escalabilidade".
Sobre o hub, pragmaticamente, é um sonho antigo de vários de nós, mas falta financiamento e um sponsor que esteja disposto a investir no tema "a fundo perdido". Os relatos da formação do campo falam repetidamente na importância de programas como o da Russel Sage Foundation* na virada das decadas de 80 para 90, onde a "tocha" foi passada da geração de psicólogos rebeldes (K/T, Slovic, etc.) para uma geração de novos economistas que multiplicou as aplicações e implicações (Camerer, Odean, Sendil, Rabin....). Da mesma forma, na última década, o único ponto em comum entre o estabelecimento de práticas de ciência comportamental aplicada no setor privado (e público também) foi a presença de um sponsor com poder e "costas largas" para bancar os primeiros passos do time. Coisa difícil de encontrar na cultura organizacional brasileira.
* posso estar enganado quanto a um nome ou outro, mas o ponto não muda.
Acredito que o desafio do interesse não seja só local - temos esse cenário em países como EUA e alguns locais da Europa. O motivo, de forma simplista, me parece ser a dificuldade da replicabilidade, o excesso de promessas, a semelhança como "táticas" de marketing e a complexidade de mudar comportamentos de forma sustentável, em especial pensando em uma visão de longo prazo quando a maior parte das "promessas" mira o curto prazo (em especial aquelas que são financiadas ou parte de produtos que precisam gerar retorno rápido). Sobre o Hub - só pergunto, o que falta para começar?